A equipe de reportagem do Jornal Opção Entorno conversou com técnicos para detalhar a real situação que Valparaíso enfrenta com as erosões e voçorocas. O engenheiro Alessandro Solano, morador de Valparaíso de Goiás e estudioso das voçorocas, voltou a alertar para o risco de comprometimento da BR-040 com a chegada das chuvas. Segundo ele, a obra emergencial do DNIT, feita entre julho e setembro com gabiões, “não resistiu à primeira chuva de setembro e virou um desastre ambiental”.

Uma empresa contratada pelo DNIT (Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes) fez intervenções, com colocações de pedras, porém, não foram suficientes à força das chuvas do dia 24 de setembro. O sistema de gabiões instalado foi completamente destruído. O material escorreu para áreas de nascente e causou um desastre ambiental. “O solo está enfraquecido e sem a resistência natural. Qualquer novo evento de chuva pode provocar rompimentos, inclusive em direção à rodovia”, disse o engenheiro ouvido pela reportagem.

O engenheiro civil, Alessandro Solano, apontou projetos que podem reverter a situação e salvar vidas. Foto: Graciliano Cândido/ Jornal Opção

Solano afirma que medidas paliativas “não resolvem mais” e defende soluções estruturais com contenção, drenagem e infiltração controlada. O técnico, explicou alguns projetos que podem ser feitos na principal voçoroca de Valparaíso, que é rota de mais de 100 mil motoristas por dia.

1) Projeto da Prefeitura (que ele não recomenda)

Há um projeto solicitado pela gestão municipal que cria uma bacia de contenção no fundo da voçoroca e outra na entrada das manilhas. Ele deixa grande parte da área como está e transfere o problema para outros pontos entre a BR e a ferrovia. Segundo ele, não resolve a causa.

2) Solução 1 da equipe técnica (bacia imediata no núcleo da voçoroca)

Uma bacia de contenção imediata, no núcleo da voçoroca, com alta capacidade e reforço estrutural para grandes vazões. Um vertedouro conduziria a água para uma galeria, que desaguaria antes da ferrovia em uma lagoa de contenção. Daí, seguiria por gravidade para o córrego Barbatimão e, na sequência, para o Ribeirão Gamal.

3) Solução 2 da equipe técnica (rede de bolsões ao longo da BR-040)

A opção é distribuir bolsões de contenção desde a divisa com o Distrito Federal, ao longo da margem oeste da BR-040, aproveitando a faixa de 60 a 80 metros entre a rodovia e a marginal.
Os bolsões teriam fundo britado para aumentar a permeabilidade; parte da água infiltra, o excedente desce em cascata até chegar às bacias inferiores.

Aproveitamento da vazante e lagoa estrutural

A vazante, perto do Shopping Sul e de áreas muito acidentadas e pouco ocupadas, dá para implantar uma grande bacia/lagoa. Além de segurar picos de cheias, pode armazenar água de chuva para usos múltiplos — uma espécie de ‘Lago Paranoá em menor escala’.

Falta de planejamento e pressão sobre a cidade

De acordo com Solano, há mais de 10 voçorocas em estágio avançado no município. As mais críticas estão próximas a condomínios e áreas de grande circulação, colocando em risco milhares de moradores. “A erosão da BR-040 é a mais grave, mas não é a única. No bairro Anhanguera, por exemplo, há dezenas de condomínios com processos erosivos em andamento. O solo está cedendo em várias partes da cidade”, relatou.

Foram catalogadas mais de 10 erosões em estágio avançado por todo o município de Valparaíso. Foto: Reprodução

O presidente da Associação de Síndicos, Moradores e Condomínios de Valparaíso, Francivaldo Sabóia, relatou que a situação das erosões que se transformam em voçorocas preocupa cada vez mais os moradores. Segundo ele, há condomínios divididos por enormes fendas no solo, semelhantes à que ameaça a BR-040. “Nós já apresentamos denúncias, participamos de sessões na Câmara de Vereadores e usamos a Tribuna Popular, mas até agora não tivemos retorno nem visitas oficiais — apenas a imprensa tem ido até os locais”, afirmou.

Francivaldo contou que a associação acompanha não só esses casos mais críticos, mas também outros pontos da cidade, como no setor de Chácaras Ipiranga, onde o solo apresenta afundamentos e rachaduras. Ele critica a falta de ação conjunta entre construtoras e poder público. “Costumam dizer que é área privada, que é problema das construtoras. Mas quem libera os alvarás e autorizações é a Prefeitura. Então, a Prefeitura joga para as empresas, as empresas jogam para a Prefeitura, e nada é feito. Infelizmente, é essa a realidade em que vive Valparaíso”, lamentou.

A especialista em reabilitação urbana, gestora ambiental e mestranda em drenagem sensível à água (UnB) Paloma Ludmyla explicou que esse tipo de erosão tende a se agravar em áreas com alta impermeabilização do solo e ausência de drenagem adequada. Para ela, além das ações emergenciais, é imprescindível investir em soluções estruturais, como a construção de bacias de retenção para conter o volume e a força das águas pluviais. Paloma defende também a inclusão de medidas de requalificação ambiental e de respeito ao planejamento urbano no projeto definitivo.

Risco de colapso viário

Solano teme que, caso o solo ceda novamente, a rodovia possa ser interditada. A distância da voçoroca até o início da rodovia é de apenas 12 metros. “Se houver novo desmoronamento em direção à BR, um dos sentidos da pista será comprometido. Isso vai causar um colapso no trânsito. Estamos falando de uma rodovia que recebe até 400 mil veículos por dia, incluindo caminhões de carga de todo o país.”

Segundo ele, a falta de ação pode provocar prejuízos nacionais. “A BR-040 é uma rota estratégica. Um bloqueio ali afetaria o transporte de insumos e alimentos para várias regiões do Brasil.”

“Falta vontade política”

O engenheiro criticou a demora do poder público em resolver a situação e reforçou que a solução está pronta, mas depende de decisão política. O DNIT tem conhecimento da principal voçoroca de Valparaíso, há pelo menos 6 meses, e o projeto para resolver a situação continua em andamento. “Projetos existem. Estudos existem. Falta vontade. Enquanto isso, a cidade corre risco e a população fica à mercê das chuvas. A Defesa Civil não pode agir só depois da tragédia — tem que prevenir”, acrescenta Solano

Procurado, o Departamento nos respondeu através de nota:

O DNIT informa que executou o fechamento da área da erosão para preservar a segurança dos usuários da rodovia. Os serviços preventivos para a estabilização da erosão durante o período chuvoso já foram concluídos. O DNIT mantém equipes para monitoramento constante na área, além de profissionais e maquinários alocados para eventualidades.

O DNIT acrescenta que a elaboração do projeto de obras permanentes está em andamento.

A Prefeitura de Valparaíso de Goiás foi procurada para responder sobre a situação, através da Secretaria de Meio Ambiente e Defesa Civil, pastas comandadas pelo mesmo gestor. A resposta veio através de nota:
A Prefeitura de Valparaíso de Goiás, por meio da Secretaria Municipal de Meio Ambiente (SEMMA) e da Defesa Civil Municipal, esclarece que atualmente o município possui número reduzido de erosões em comparação ao informado. Todas as ocorrências são rigorosamente monitoradas e contam com intervenções constantes realizadas pela Secretaria Municipal de Infraestrutura (SINFRA), pela VLI e pelo Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT), conforme a responsabilidade técnica de cada órgão.

Em relação à voçoroca localizada às margens da BR-040, importante destacar que as ações e obras emergenciais permanecem sob responsabilidade do DNIT, que segue com intervenções mesmo durante o período chuvoso para garantir segurança e estabilidade do local. O município segue acompanhando e colaborando institucionalmente para que as soluções necessárias sejam executadas com celeridade.

Ressalta-se também que parte das erosões presentes em Valparaíso tem origem em loteamentos antigos, anteriores à Lei Federal do Parcelamento do Solo (Lei nº 6.766/1979), quando ainda não havia a exigência legal de infraestrutura adequada para drenagem. Atualmente, todos os novos bairros aprovados pelo município já são implantados com estrutura completa para o correto escoamento de águas pluviais, o que reduz significativamente o risco de surgimento de novas áreas degradadas.

Outro fator que contribui para esses processos erosivos é o volume de águas pluviais provenientes de loteamentos situados fora dos limites de Valparaíso, principalmente oriundos do Distrito Federal, que acabam sobrecarregando o sistema natural de drenagem.

Para prevenir o avanço e o surgimento de novas voçorocas, o município desenvolve estudos e projetos de drenagem pluvial, aliados à fiscalização constante e ao planejamento urbano responsável, reforçando
o compromisso da gestão com a proteção ambiental e a segurança da população.