Conhecido no Brasil como “observação de aves” ou “passarinhada”, o birdwatching ainda é pouco disseminado no país, sendo uma alternativa de lazer para quem gosta de admirar pássaros em seu habitat, ao ar livre, sem interferir no seu comportamento ou no seu ambiente. Somente em Goiás, existem 590 espécies conhecidas até o momento. Portanto, o estado apresenta muito potencial para a prática, principalmente no Parque Estadual de Terra Ronca e nas regiões da Chapada dos Veadeiros, Chapada das Emas, Vale do Araguaia e Entorno do Distrito Federal.

O presidente da Goiás Turismo, Fabrício Amaral, acredita que essa modalidade turística tem potencial para deslanchar, mas ainda falta divulgação, para despertar o interesse dos amantes da natureza, sejam amadores ou especialistas. “Além de falar sobre a área do turismo, essa é uma pauta ambiental, humana, que merece capa de jornal”, exalta Fabrício. “É um segmento que tem despertado nossa atenção já há algum tempo. O mercado americano movimenta muito dinheiro e gera muitos empregos vindos do birdwatching, o passarinhar. E em Goiás tem espécies raras, sobretudo na região do Araguaia, no Parque das Emas e na região do Nordeste Goiano, no Terra Ronca”, relata Fabrício.

Fabrício Amaral: “Essa é uma pauta ambiental, humana, que merece capa de jornal” (Foto: Divulgação/ Goiás Turismo)

O turismo de observação de aves no estado, devidamente planejado e executado, pode contribuir para o crescimento do ecoturismo, gerando benefícios socioeconômicos e ambientais. “Temos acessibilidade e guias qualificados, e ainda vamos buscar mais qualificação a custo zero. Nós acabamos de chegar de São Paulo, do Avistar 2024, e levamos instituições de ensino”, destaca Fabrício, acrescentando que foi a primeira vez que Goiás participou do renomado evento, posicionando o estado como um destino de observação de pássaros no Brasil.

Equipe da Goiás Turismo no Avistar 2024 (Foto: Divulgação)

Para profissionais e amadores

A prática de observar aves pode, de fato, ser um meio para o desenvolvimento de rotas turísticas e ser associada, por exemplo, ao turismo rural. No Entorno, o Hotel Fazenda Araras, que fica em Formosa, já aposta nessa vertente. “A observação de aves aqui na nossa região começou em 2008, com um projeto do Sebrae, que abrange tanto profissionais na área de observação de pássaros, quanto as pessoas que praticam como hobby”, recorda a proprietária do hotel, Ludmila Souza.

Segundo ela, no interior da propriedade foram detectadas 116 espécies de aves e 55 nas áreas adjacentes. “A riqueza total da nossa região é de 123 espécies de aves, que representam aproximadamente 27% do total de 456 espécies que ocorrem no DF”, revela Ludmila. “No nosso empreendimento ainda é predominante o público internacional, principalmente de embaixadas e comissões. No Brasil isso vem se difundindo gradativamente”, comenta.

O Hotel Fazenda Araras, em Formosa, já conta com 116 espécies de aves na propriedade (Foto: Divulgação)

Observação aliada à preservação

Projeto de extensão da Universidade Federal de Goiás (UFG) iniciado em 2016, o Óia Passarinhar visa estimular a observação de aves, aproximando a universidade da comunidade. “O projeto surgiu de dois pontos principais. O primeiro é o papel da universidade em formar pessoas integradas com a realidade e próxima da sociedade. Em segundo lugar, para fazer uma conservação da nossa biodiversidade, precisamos trazer toda a sociedade para se preocupar com o meio ambiente”, frisa o coordenador do projeto Arthur Bispo, que também dá aulas na UFG, no curso de educação intercultural.

O Óia Passarinhar possui algumas frentes de ação voltadas para o público em geral e para os filiados, como se fosse um clube de observadores de aves. Hoje, possui 210 membros e tem quatro principais ações: divulgação, comunicação, observação e capacitação. “Nós já formamos cerca de 280 pessoas e especializamos para o turismo de observação de aves cerca de 75, nos cursos de formação de guias e condutores para observação”, revela Arthur.

Equipe do projeto do Óia Passarinhar em ação: já são 210 filiados ao projeto (Foto: Divulgação)

Em maio deste ano, o Óia Passarinhar esteve no Avistar 2024, que é o maior encontro de observadores de aves da América Latina, e por lá passaram cerca de 12 mil pessoas. “Apresentamos o projeto e os trabalhos que estamos desenvolvendo, e participamos dos fóruns de Destinos Silvestres e o Fórum Nacional para o Turismo de Vida Silvestre”, conta Arthur.

Para ele, é necessário popularizar o birdwatching. “Nosso projeto tem como proposta justamente trazer a sociedade para essa ação, que pode ser desenvolvida no quintal de casa. Então, não precisamos ser superespecializados. Em Goiânia mesmo temos em torno de 400 espécies de aves e uma disponibilidade muito grande de parques municipais. A ideia é trazer esse público para usar as áreas públicas e fazer essa atividade”, garante o coordenador do Óia Passarinhar.

Academicamente, o projeto tem sido inovador na forma de se fazer extensão. “O turismo de observação salva vidas, traz as pessoas para uma atividade saudável, de interação com a natureza”, afirma Arthur. E conclui: “Ele cria um dinamismo pelo vício de sempre querer ver mais espécies em diferentes locais, além de estimular a interação social e os encontros de pessoas com as mesmas finalidades”.

Divulgação da prática

Larissa Darin acredita que é preciso divulgar mais a prática do birdwatching (Foto: Divulgação)

Adepta do birdwatching, a observadora Larissa Darin diz que é preciso disseminar mais essa atividade. “Acredito que o que mais falta é a divulgação dessa prática, para que mais pessoas possam se interessar. Muitas nem sabem que existe essa possibilidade de sair para observar aves em grupo”, analisa.

Ela conta que sempre teve interesse em atividades de observação da natureza, mas não havia encontrado nenhum grupo específico, até conhecer uma integrante do Óia Passarinhar. “Desde então, minha paixão por observar aves só cresceu, me filiei ao Óia e passei a participar com frequência das passarinhadas organizadas por eles”, revela.

Conscientização ambiental

Estevão Freitas “A difusão da observação de aves para um público maior depende, antes de tudo, de uma educação ambiental mais consistente” (Foto: Divulgação)

Mesmo com poucos adeptos ainda no país, o birdwatching já começa a despertar interesse de gente muito jovem. É o caso do ornitólogo Estevão Freitas, de apenas 19 anos, que observa aves “por amor, não por precisão”, como costuma dizer. Seu interesse pelos pássaros e pela natureza, especialmente pelo Cerrado, começou ainda na infância. “Passei os primeiros anos da minha vida mergulhado em bibliotecas, examinando livros sobre animais e plantas, ouvindo as histórias dos meus antepassados sobre o Cerrado intocado do interior do Brasil, e observando as outras formas de vida que compartilhavam comigo os espaços verdes da cidade, meu quintal e meu entorno”, detalha Estevão.

Aos 7 anos, ele descobriu os pássaros do Cerrado como mais um componente dessa paixão, a partir da leitura de algumas obras sobre o tema, inclusive guias de campo, que passaram a fazer com que ele identificasse as aves já observadas no cotidiano. “Isso me permitiu conhecê-las melhor e me interessei mais a fundo por seu mundo. Prontamente passei a estudá-las nas pequenas viagens que eu fazia pelo Cerrado”, lembra o jovem, que já completa 10 anos de estudos ornitológicos no Planalto Central.

Estevão recebendo um grupo de jornalistas da comitiva do chanceler alemão Olaf Scholz, para observação de aves no Jardim Botânico de Brasília (Foto: Divulgação)

Para ele, o público precisa se conscientizar acerca da natureza que o cerca, para que esse turismo seja mais promissor. “Acho que o primeiro passo para angariar interessados na observação de aves, é a criação de práticas culturais de contemplação da natureza, principalmente no âmbito do turismo”, propõe. “Infelizmente, o incentivo ao ecoturismo no Brasil ainda é muito limitado a atividades como trilhas e cachoeiras, sendo inclusive bastante predatório na sua relação com o meio ambiente”.

De acordo com Estevão, o birdwatching, diferentemente do “turismo de trilha” comum, exige do praticante silêncio, concentração e sensibilidade aos fenômenos do mundo natural, além de muita paciência e dedicação à atividade. “Nesse sentido, a difusão da observação de aves para um público maior depende, antes de tudo, de uma educação ambiental mais consistente, que nos permita estabelecer uma relação mais profunda com a natureza”, reflete, acrescentando que o birdwatching traz como uma de suas vantagens o fato de ser uma alternativa econômica sustentável. “Nos Estados Unidos, por exemplo, um relatório de 2018 informou que o turismo de observação de aves gerou mais receita que as atividades de mineração no país”, conclui.

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