Nos últimos dias, campanhas publicitárias e manifestações de artistas têm gerado polêmica e debates sobre o impacto do extremismo político na economia e na atuação de empresas. Um dos casos recentes envolveu a Havaianas, que veiculou um comercial com a atriz Fernanda Torres incentivando o público a começar 2026 “com os dois pés”, usando expressões como “os dois pés na porta, na estrada, na jaca, onde você quiser”.

A campanha foi interpretada por políticos e militantes de direita como um ataque ideológico, associando a expressão “pé direito” à direita política. Deputados e vereadores bolsonaristas afirmaram que deixariam de comprar Havaianas e indicaram outras marcas de chinelo, como Rider, Ipanema, Crocs e Olympikus, enquanto acusaram a empresa de transformar um símbolo brasileiro em “panfleto político”.

Outro episódio de repercussão ocorreu com a emissora SBT. O cantor Zezé Di Camargo criticou publicamente as filhas de Silvio Santos e a condução da emissora, citando a participação do presidente Lula e do ministro Alexandre de Moraes em um evento institucional. Após o episódio, o SBT cancelou a exibição de um show especial de Natal gravado por Zezé Di Camargo, decisão confirmada por Daniela Beyruti, presidente da empresa, que também avalia medidas jurídicas. O presidente Lula se manifestou, expressando solidariedade às filhas de Silvio Santos e criticando a atitude do cantor.

O cientista político Henrique Araújo avalia os impactos sociais e econômicos desses episódios e destaca como a polarização pode influenciar decisões de consumo e a atuação de empresas. Segundo Araújo, “primeira coisa a analisar, as pessoas no Brasil hoje, tanto aquelas que se envolvem na política quanto as que não se envolvem, trocaram o debate político por uma paixão como se fosse um clube do coração. O time dentro de campo comete erros, mas a pessoa fecha os olhos para isso e só se importa se venceu a disputa simbólica. Isso vale tanto para a esquerda quanto para a direita.”

Ele ressalta também os pontos positivos e negativos do cenário atual: “Ou seja, o que há de positivo nisso é que nós ainda vivemos em um país onde as pessoas podem decidir qual lado político vão defender. O lado negativo é o prejuízo que empresas têm quando não analisam de forma prática o seu marketing, e o debate político em busca de melhorias para a população também sai prejudicado.”

Araújo compara a atual postura política à antiga consciência de classe: “O que nos remete a anos atrás, quando surgiu o termo consciência de classe, é que hoje temos uma consciência política ideológica, mas, ao meu ver, só trocou seis por meia dúzia. O que antes era luta por direitos, hoje é disputa simbólica. Quando empresas entram nesse debate de forma singela, há prejuízo quando uma grande massa interpreta a propaganda como alinhada a um lado político e promove boicotes.”

O cientista político conclui. “O brasileiro hoje deixou de discutir política racionalmente para discutir emocionalmente, defendendo seu ‘time’ e ignorando os erros do próprio lado. Não analisar o cenário político antes de lançar uma campanha deixa margem para interpretações negativas, enquanto extremismo e boicotes ideológicos podem substituir debates que beneficiariam a população, como educação, saúde e geração de empregos.”