Motim no Congresso: juristas apontam quebra de decoro e possível crime de prevaricação

09 agosto 2025 às 15h04

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A ocupação das mesas diretoras da Câmara e do Senado por parlamentares da oposição, nesta semana, ultrapassou os limites da liberdade de expressão e da atuação política, configurando quebra de decoro parlamentar e possível crime de prevaricação. A avaliação é de juristas ouvidos pelo Jornal Opção Entorno, que consideram a ação um motim sem amparo no regimento interno.
Para o professor de Políticas Públicas do Ibmec Brasília, Eduardo Galvão, a obstrução legítima precisa seguir mecanismos formais previstos nas normas da Casa. “O que ocorreu foi uma distorção desse recurso, sem respaldo legal, o que compromete a legitimidade da ação e abre espaço para abusos”, afirmou.
Nesta sexta-feira (8), o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), indicou a punição de afastamento do mandato por até seis meses para cinco deputados envolvidos no tumulto: Marcos Pollon (PL-MS), Zé Trovão (PL-SC), Júlia Zanatta (PL-SC), Marcel van Hattem (Novo-RS) e Camila Jara (PT-MS). O protesto, que pedia anistia ao ex-presidente Jair Bolsonaro, impediu o início da sessão e travou a votação de pautas econômicas relevantes, como a reforma do Imposto de Renda, a regulamentação da reforma tributária, a Lei de Diretrizes Orçamentárias e a Medida Provisória sobre compensações do IOF.

O professor de Políticas Públicas do Ibmec Brasília, Eduardo Galvão, conversou em detalhes sobre o episódio no Congresso Nacional.
Graciliano Cândido – Obstrução no Congresso Nacional: democrático ou ameaça?
Eduardo Galvão – A obstrução legítima acontece quando parlamentares usam os instrumentos previstos no regimento para atrasar ou travar votações — é parte do jogo democrático. Mas o que vimos agora não foi isso. Foi uma coerção política, fora das regras regimentais, que fere as bases da democracia, do diálogo e da negociação. Quando o Parlamento se move por retaliação a questões pessoais ou corporativas, ele deixa de ser a arena do debate e se transforma em palco de pressão ilegítima. É a “autofagia do Legislativo”: quando a Casa deixa de servir à sociedade e começa a se corroer por dentro.
Graciliano Cândido – Até que ponto essa obstrução começa a afetar os interesses da sociedade brasileira?
Eduardo Galvão – O prejuízo é imediato. Ao se recusar a funcionar dentro das regras, o Congresso paralisa decisões essenciais para o país — como reformas, medidas econômicas e respostas a emergências. Não é só uma questão de atrasar o calendário legislativo, mas de bloquear a capacidade do Estado de atender às necessidades da população.

Graciliano Cândido – Quais os mecanismos que os presidentes da Câmara e do Senado devem adotar nesses casos?
Eduardo Galvão – Hugo Motta e Davi Alcolumbre têm o dever de proteger o funcionamento institucional. Isso exige chamar a responsabilidade para si, garantir o cumprimento do regimento e impedir que práticas coercitivas substituam o debate. O caminho é reafirmar que divergências políticas se resolvem com voto e negociação, não com bloqueios ilegítimos que corroem a credibilidade do Legislativo.