Colocar nomes técnicos em cargos estratégicos é uma marca do governo de Ronaldo Caiado. E no que tange à gestão educacional no estado, essa premissa foi firmemente cumprida e trouxe resultados extremamente positivos, inclusive nas cidades circunvizinhas ao Distrito Federal. A titular da Secretaria de Estado da Educação de Goiás (Seduc-GO), Fátima Gavioli, que o diga. Convocada por Caiado para assumir a pasta em 2019,  ela diz que o Entorno era tratado como se não fosse de Goiás na parte educacional, mas essa realidade mudou radicalmente. “Hoje temos, inclusive, colégios de turno integral no Entorno, que antes eram um sonho”, afirma.

E essa reviravolta em poucos anos pode ser explicada não só pela competência em gerir uma secretaria repleta de desafios. Pode-se inserir nessa “receita” bem-sucedida, pitadas de determinação e resiliência, somadas à personalidade forjada pela origem humilde e capacidade de se agarrar a toda e qualquer oportunidade.

Formada em Letras, Direito e Pedagogia, além ser doutora em Psicologia da Educação, Fátima sempre almejou a docência, mesmo quando, em determinada etapa de sua vida, teve de cumprir a rotina diária de empregada doméstica na residência de uma família em Cacoal (RO). Então, ingressou na faculdade, obteve a licenciatura em Letras e passou em primeiro lugar em um concurso para seleção de professores na rede pública estadual.

Sua atuação como docente chamou a atenção de políticos e sua entrada na vida pública era só questão de tempo. De 2014 a 2016, foi secretária de Educação de Rondônia. No ano seguinte, engatou a vice-presidência da região Norte no Conselho Nacional de Secretários de Educação (Consed). O restante de sua trajetória, o sucesso já fala por si.

Nesta entrevista ao Jornal Opção Entorno, Fátima Gavioli fala sobre alguns dos principais projetos implementados à frente da Seduc-GO que beneficiaram municípios do Entorno e aborda, inclusive, a polêmica questão do combate à violência nas escolas.

Luciana Amaral – Antes do início das aulas, o governo de Goiás investiu em mochilas, estojos e kits de material escolar para garantir equidade a alunos da rede estadual. As escolas estaduais no Entorno já foram todas contempladas com esses materiais?

Fátima Gavioli – Este já é o quarto ano que estamos realizando a entrega ininterrupta de uniformes, materiais escolares e mochilas. No caso das mochilas, tivemos de fazer uma adequação, pois os alunos não estavam gostando do modelo. Isso atrasou um pouco a entrega, mas, neste momento, todas as regionais já receberam, inclusive as do Entorno.

Com o governador Ronaldo Caiado durante evento de entrega de cartões do Bolsa-Estudo para alunos do 9º ano (Foto: Divulgação/ Seduc-GO)

Luciana Amaral – Alunos do 9º ano foram incluídos neste ano entre os que têm direito a receber o Bolsa-Estudo, que antes era oferecido apenas a estudantes do Ensino Médio. Por quais motivos houve essa ampliação do programa?

Fátima Gavioli – Cerca de 20 a 25% dos alunos que concluem o 9º ano do Ensino Fundamental não se matriculam na primeira série do Ensino Médio, pois saem em busca de trabalho. Então, o governador Ronaldo Caiado resolveu ampliar o Bolsa-Estudo para o 9º ano e evitar a evasão escolar na hora de ingressar no Ensino Médio. A nossa intenção é, no final de 2024, avaliar o impacto da medida.

Luciana Amaral – Qual valor é destinado aos alunos?

Fátima Gavioli – Hoje o valor da Bolsa é de R$ 112.

Luciana Amaral – Durante o Encontro com Mediadores da Inclusão, foi lançado o novo modelo do Plano Educacional Individualizado (PEI) para a rede estadual de Educação. Em que consiste este plano? Ele já foi implementado nas escolas do Entorno?

Fátima Gavioli – Quem coordena a educação especial é o mediador da inclusão de cada unidade regional, que pode ser Formosa, Luziânia, Águas Lindas, Planaltina e outras. Esses mediadores estiveram em Goiânia para receber a formação e realizá-la em todas as regionais, inclusive as do Entorno. São eles que levam o plano para as salas de Atendimento Educacional Especializado (AEE) do estado. Antes, Goiás não dispunha de um plano para atendimento, por exemplo, de alunos com Síndrome de Down, autismo, déficit de atenção etc. Todos esses estudantes estavam matriculados na rede, mas cada criança tem um jeito e um tempo para aprender; as crianças especiais, muito mais. A ideia, agora, com o PEI, é tratar cada deficiência com o seu tratamento pedagógico.

Encontro de Formação para Mediadores da Inclusão (Foto: Divulgação/ Seduc-GO)

Luciana Amaral – O projeto GoFuture está sendo implementado primeiramente em Goiânia. Poderia falar um pouco sobre essa iniciativa e quando estará disponível para outras regiões, como o Entorno?

Fátima Gavioli – É um projeto piloto que está ocorrendo em Goiânia, para potencializar as habilidades dos jovens dentro das escolas da rede pública. Caso os nossos resultados sejam positivos em Goiânia, queremos levar essa experiência para outras unidades escolares da rede estadual. O projeto é mantido com parcerias. Não envolve tanto o servidor ou professor, mas universitários que têm a intenção de levar esse protagonismo aos nossos jovens do Ensino Médio. Queremos também inserir palestras que possam motivar o jovem a descobrir qual carreira seguir. Afinal de contas, o que ele pensa em fazer quando concluir o Ensino Médio, como ele pode agir para transformar a rua, o bairro e a escola dele? Esse projeto tem um pouco do perfil do programa Estudantes de Atitude.

Luciana Amaral – Como tem sido a parceria da Seduc com os municípios do Entorno na execução do programa de alfabetização AlfaMais Goiás e quais resultados têm sido alcançados na região?

Fátima Gavioli – O AlfaMais Goiás existe há dois anos e visa promover a alfabetização na idade certa para as crianças. O programa começou antes do Governo Federal lançar o Pacto pela Alfabetização e é muito modelado no programa de alfabetização de Sobral, no Ceará. Durante esse período, nossa parceria com os municípios se deu por meio de envio de R$ 150 mil para os prefeitos, a fim de que eles aplicassem a verba na reforma das unidades, dentro do projeto Reformar Mais+. Nós compramos material escolar para todos os alunos da rede municipal do 1º e 2º anos. Toda a formação de professores, supervisores e orientadores é feita pela Secretaria de Educação, assim como toda a produção de material utilizado em sala de aula. Aquelas escolas que se destacaram na avaliação, nós vamos premiar sempre com R$ 80 mil cada colégio. São 150 instituições premiadas; as melhores com R$ 80 mil; as que não se saíram bem, também recebem. Então são R$ 160 mil, na verdade. A ideia é a seguinte: se a minha escola não foi bem e a sua teve um bom desempenho, você adota a minha escola. Eu recebo R$ 80 mil e você também. Só que você me adota para melhorarmos, juntos, os nossos resultados. O bom de tudo isso, é que esta semana eu recebi a avaliação e realmente as escolas municipais deram um salto. Todas elas cresceram no programa de alfabetização. E o Entorno cresceu bastante, também.

Luciana Amaral – Sobre o Saego Alfa, sistema que afere os níveis de conhecimento de estudantes em Língua Portuguesa e Matemática do 2º ao 5º anos do Ensino Fundamental, como tem sido o desempenho das escolas do Entorno?

Fátima Gavioli – Temos várias escolas que se destacaram. Em Planaltina foram sete unidades escolares; em Formosa e Luziânia, seis escolas cada; em Novo Gama, três; e em Águas Lindas foram duas. Estes são os números das que mais apresentaram crescimento no AlfaMais.

Fátima Gavioli discursa no I Encontro do Programa Alfa Mais Goiás de 2024 (Foto: Divulgação/ Seduc-GO)

Luciana Amaral – Em sua opinião, qual o papel da boa gestão nas escolas diante dos resultados das avaliações de aprendizagem?

Fátima Gavioli – A gestão é o coração da escola. Se o gestor tiver o compromisso pedagógico, a escola vai melhorar, vai crescer. Porque ele vai monitorar, verificar os dados, ver que os alunos estão precisando de um atendimento de recomposição de aprendizagem e acompanhar o horário de planejamento dos professores. Então, o gestor é tudo. Agora, quando ele é mais financeiro e administrativo do que pedagógico, a escola sofre demais.

Luciana Amaral – Poderia falar um pouco sobre o programa GoiásTec – Ensino Médio ao Alcance de Todos e quais impactos está gerando na região do Entorno?

Fátima Gavioli – O GoiásTec é um projeto que tende a universalizar o Ensino Médio, por beneficiar alunos em localidades de difícil acesso. As aulas são mediadas por tecnologia, acontecem em tempo real e a grande novidade para nós este ano foi que no top 12 do Saego – ou seja, as unidades escolares que mais se destacaram em Goiás – três escolas são do Entorno, sendo duas de Formosa. E a que está em primeiro lugar, inclusive, é do GoiásTec. Então, ele é um projeto que veio para ficar e eu acredito muito nele. Os alunos têm conseguido notas muito boas no Enem e nos vestibulares das universidades. O longo tempo que eles passavam dentro de um ônibus para chegar a uma escola onde pudessem cursar o Ensino Médio, hoje é utilizado para se dedicar à família, aos estudos e ao reforço de aprendizagem.

Luciana Amaral – Em 2023 foi instituído o programa de educação socioemocional e assistência psicossocial “Ouvir e Acolher”. Como isso tem funcionado na comunidade escolar do Entorno?

Fátima Gavioli – O programa Ouvir e Acolher abrange a contratação de psicólogos e assistentes sociais para realizar atendimentos nas escolas estaduais. Hoje nós temos, atuando em cada regional, dois psicólogos e uma assistente social. Eles trabalham junto aos estudantes tanto em campanhas preventivas, como combate ao bullying, quanto no atendimento direto de casos que podem gerar, por exemplo, situações de violência na escola. Eles são responsáveis por fazer todo o acolhimento à família do estudante nessa hora.

Fátima durante reunião na Secretaria da Educação (Foto: Divulgação/ Seduc-GO)

Luciana Amaral – Diante de tragédias e ataques ocorridos em escolas, como a questão da segurança na comunidade escolar é tratada pela Secretaria e como tem sido a realidade no Entorno, nesse sentido?

Fátima Gavioli – Hoje em dia, a segurança escolar é um assunto diário. Antes não precisávamos falar sobre isso. Ficávamos focados somente na parte pedagógica, administrativa e financeira. Agora, infelizmente, por conta dos casos que foram ocorrendo pelo mundo, no Brasil e em Goiás, principalmente no Entorno, onde já tivemos ocorrências muito tristes, inclusive com óbito, a pauta da segurança se tornou diária. Uma boa parte do orçamento da Seduc, inclusive, é voltada a isso. Estamos investindo, por exemplo, em detectores de metais, assim como ocorre nos bancos, e na vigilância monitorada, para verificar todos os ambientes escolares e a movimentação de pessoas. Também investimos em formação, como a que tivemos em Goiânia, ministrada pelo Major Cunha para servidores cujo papel é garantir a segurança nas unidades escolares.

Luciana Amaral – Essas medidas têm sido bem recebidas pela comunidade?

Fátima Gavioli – Na verdade, essa pauta de segurança não era de nossa responsabilidade. Hoje, se você não usar o detector de metais, se você não cumprir o que está sendo pedido para ser feito na portaria, uma pessoa entrar armada e ocorrer uma tragédia lá dentro, nós vamos passar a responder por isso. Porque essa responsabilidade intramuros de garantir que o portão não fique aberto, que a escola seja um lugar extremamente restrito, com identificação, agora é nossa. Se não cuidarmos disso, você pode ter certeza de que, daqui a alguns dias, seremos processados por essas situações nas escolas.

O Estado de Goiás investiu R$ 2,5 milhões em segurança no último ano. Esse dinheiro poderia estar sendo usado para a parte pedagógica, para a formação de professores, para aquisição de equipamentos, mas foi aplicado em segurança, porque, infelizmente, estudantes e até outras pessoas que não são ligadas à escola, estão entrando no ambiente escolar para ferir, matar e furtar. É algo inadmissível. A escola só perde para a igreja, em relação ao sagrado. Não entendo como conseguiram, de repente, transformá-la em um lugar com tanta violência.

As pessoas têm uma visão deturpada de que é preciso colocar polícia na escola. Não, gente! A polícia tem que estar na rua, tem que garantir a segurança da população como um todo. Nós temos a obrigação, na condição de pais, responsáveis pelo jovem, pelo adolescente, de entender o que está acontecendo com os nossos filhos: o que ele está acessando, quanto tempo está ficando em frente ao computador. Eu falo sem medo de errar: é muito triste para um professor em tempo de aposentadoria como eu, ter que saber que quase 30% do nosso tempo na escola hoje está sendo consumido com segurança. Hoje você tem que planejar aula e corrigir provas, mas precisa também conhecer o protocolo de segurança, para saber o que fazer, se ocorrer um ato de violência na escola.

Foto: Divulgação/ Seduc-GO

Luciana Amaral – Na atual gestão houve o fim do chamado “turno da fome”. O que é isso e como afetava as escolas do Entorno?

Fátima Gavioli – Quando assumimos em 2019, o Entorno do Distrito Federal tinha o chamado “turno da fome” e foi chamado desta forma durante 10 anos. Antigamente, pela manhã, a criança entrava na escola às 7h e saía às 10h30 para “merendar”. Se você parar para pensar, só aqui eu tirei do aluno uma hora de aula. Então, esses estudantes tinham um prejuízo em conteúdo e em conhecimento muito grande, em relação ao restante do Estado de Goiás. Às 11h entrava outro grupo e saía às 13h30. Uma hora a menos de aula também, mas com uma condição: esse turno não tinha merenda, porque não dava tempo de fazer e nem havia merendeira para isso. Então, era chamado de “turno da fome”. Depois vinham os turnos da tarde e da noite.

Portanto, as escolas no Entorno tinham quatro entradas de alunos por dia e uma delas recebia essa denominação. Por que isso ocorria? Porque não havia construção, ampliação e reforma das escolas e elas não eram cuidadas. O Entorno foi tratado realmente como se não fosse de Goiás na parte educacional. Aí nós entramos, o governador determinou e nós ampliamos as escolas, construímos outras e terminamos praticamente todas as que estavam inacabadas. Hoje temos alguns terrenos disponíveis no Entorno para construção. E espero que os próximos governos continuem investindo na região, porque, felizmente, não existe mais o turno da fome. Pelo contrário: hoje temos, inclusive, colégios de turno integral no Entorno, que antes eram um sonho. E também fizemos nesta gestão colégios no padrão século XXI. Portanto, se você investir e acreditar, dá certo e o resultado aparece.