A Agência Goiana de Infraestrutura e Transportes (Goinfra) abriu chamamento público para empresas interessadas na execução de passagens superiores de fauna nas rodovias GO-239 e GO-118. Ambas estão no entorno do Parque Nacional da Chapada dos Veadeiros e a construção das seis estruturas para a travessia de animais silvestres será realizada no trecho que liga Teresina de Goiás a Colinas do Sul, passando por Alto Paraíso, município da Região Integrada de Desenvolvimento do Distrito Federal e Entorno (Ride-DF).

A medida cumpre parte de um acordo realizado ainda em maio de 2020 entre a Goinfra, Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), Associação Amigos da Floresta e Ministério Público. Desde então, já foram instalados alguns redutores de velocidade na região, visando evitar mortes nas rodovias tanto de pessoas quanto de animais que costumam atravessar as vias. As seis passagens de fauna superiores, apropriadas principalmente para espécies arborícolas, vão oferecer mais segurança nesse sentido. Futuramente, serão implementadas também oito passagens inferiores ou subterrâneas, mais utilizadas por mamíferos como onças, antas e tamanduás.

Modelo de passagem superior de fauna (Foto: Francini Garcia)

Ações de mitigação

Segundo o presidente da Goinfra, Pedro Sales, o investimento previsto é de aproximadamente R$ 594 milhões. “As passagens de fauna são atualmente as medidas mitigadoras mais eficazes para reduzir o número de atropelamentos de animais em rodovias”, ressalta Sales. “Ao permitir que a fauna atravesse as vias com segurança, as estruturas ajudam a preservar a biodiversidade local e diminuem os riscos de acidentes envolvendo motoristas”.

Ele reforça, ainda, que o Parque Nacional da Chapada dos Veadeiros é uma das mais importantes unidades de conservação do Cerrado, reconhecido pela Unesco como Patrimônio Mundial Natural. “Essa área protege espécies ameaçadas da fauna brasileira, como a onça-pintada, a onça-parda, o lobo-guará, o tamanduá-bandeira e o tatu-canastra, entre muitas outras”, enumera.

Sales destaca que, além da execução das travessias, a Goinfra está iniciando a estruturação de um sistema para monitorar atropelamentos de animais silvestres nas rodovias estaduais, com o objetivo de embasar ações de mitigação desses impactos. “A agência tem reforçado junto aos contratantes que os novos projetos de rodovias incluam a implementação de passagens inferiores e outras medidas que favoreçam a preservação da fauna”, finaliza.

Pedro Sales: novos projetos de rodovias deverão incluir medidas de preservação da fauna (Foto: Octacílio Queiroz)

Demanda antiga

A vice-presidente da Associação dos Amigos das Florestas, Flávia Maria Ribeiro Cantal, aponta que são contabilizados mais de 7 mil atropelamentos de animais por ano só no trecho que abrange Alto Paraíso, a Vila de São Jorge e São João d’Aliança. “E essa estimativa é subestimada. A gente sabe que é muito mais, pois as pesquisas são realizadas quinzenalmente ou semanalmente, na melhor das hipóteses”, salienta.

Os números, segundo Flávia, vêm de estudos de alunos da pós-graduação da Universidade de Brasília (UnB) e de um projeto conduzido pela zoóloga Vivian Braz no Parque Nacional da Chapada dos Veadeiros, com o patrocínio da Fundação Boticário. Essas pesquisas também ajudaram a definir os pontos de inserção das passagens de fauna.

Flávia informa que a implementação das estruturas é uma demanda antiga e teve de ser resolvida judicialmente. “A atual administração da Goinfra, sob a gestão de Pedro Sales, tem se mostrado bem mais solícita quanto a essa questão, que envolve não só o atropelamento da fauna, mas também a segurança viária. Cada anta que é atropelada, por exemplo, uma pessoa morre ou fica em estado crítico no hospital. É um acidente gravíssimo”, frisa. “Uma mitigação bem feita, que inclua redutores de velocidade e passagens de fauna, pode reduzir em até 86% os atropelamentos, segundo as pesquisas”, revela.

O biólogo Gustavo Teixeira, por sua vez, destaca que tais medidas são fundamentais para a preservação da biodiversidade. “Muitos animais, ao atravessarem as vias, acabam sofrendo acidentes, diminuindo a população da fauna naquelas localidades”, pontua. “O Parque Nacional da Chapada dos Veadeiros é um berço da fauna e flora. As passagens, inclusive, não devem ser inseridas somente ali, mas em todos os lugares de grande afluxo turístico no país”, observa.

Gustavo Teixeira defende que passagens de fauna sejam inseridas em todos os lugares com grande afluxo turístico (Foto: Divulgação)

Números nas rodovias brasileiras

O professor da Universidade Federal de Lavras (UFLA), Alex Bager, que também é CEO da startup ambiental EnvironBIT e coordenador do Centro Brasileiro de Ecologia de Estradas (CBEE) da UFLA, também traz números alarmantes sobre atropelamentos de animais silvestres, mas em âmbito nacional.

Segundo ele, a cada ano, em torno de 475 milhões de bichos são vitimados nas rodovias brasileiras. “Diariamente, são mais de 1,3 milhão de animais, a maioria de pequenos vertebrados. Por segundo, são 17. É muita coisa. E temos cerca de 10 milhões de bichos de grande porte que morrem nas vias, como anta, lobo-guará e onça”, afirma.

Cerca de 475 milhões de animais são vitimados nas rodovias brasileiras a cada ano (Foto: Divulgação)

De acordo com Bager, trata-se da maior causa da perda de animais vertebrados no país. “Existem outras, como fragmentação, incêndio e destruição de habitat, só que é muito difícil de quantificar o quanto que um processo de fragmentação, por exemplo, causa na perda de populações. O atropelamento é uma medida muito mais factível, com risco de levar espécies em extinção”, alerta. “É um problema amplo, que acontece em todos os lugares”, destaca, acrescentando que, além da construção de passagens de fauna, é preciso medidas de controle de velocidade nas vias e conscientização dos motoristas.

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