Mulheres mostram força política em municípios do Entorno
05 março 2024 às 13h28
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As mulheres representam, atualmente, 52% do eleitorado brasileiro, segundo dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Além disso, a participação feminina nas eleições de 2022 foi a maior das últimas três eleições gerais: foram registradas 9.353 candidaturas, representando 33,27% do total. Entretanto, a equidade de gênero na política ainda está longe de ser uma realidade. No último pleito municipal, em 2020, foram eleitas 651 prefeitas contra 4.750 prefeitos. Já para as câmaras municipais, foram 9.196 vereadoras eleitas, contra 48.265 vereadores.
Neste ano, quando eleitores de todo o país irão às urnas no dia 6 de outubro para eleger novos prefeitos e seus vices, além de vereadores, a Justiça Eleitoral prometeu ficar mais atenta às fraudes eleitorais relacionadas à cota de gênero. Junto a isso, espera-se um crescimento na representatividade feminina em todo o país, incluindo os municípios do Entorno do Distrito Federal.
A seguir, algumas das mulheres que se tornaram exemplos de liderança na região relatam ao Jornal Opção Entorno como superaram preconceitos e hoje são destaque na política local.
Quebra de paradigmas
No segundo ano de seu segundo mandato consecutivo, a prefeita de São João d’Aliança, Débora Domingues (PL), analisa sua gestão como um marco histórico, já que ela foi a primeira mulher a ocupar esse cargo no município. “Foi uma quebra de muitos paradigmas, mas infelizmente ainda vivemos em uma sociedade machista tradicional, em que as pessoas acreditam que posição de poder ainda não é posição para mulheres. A gente vem mudando isso aos poucos. Estar prefeita abriu a mentalidade das pessoas do município, mostrando que nós podemos ser tão boas ou até melhores do que os homens”, afirma Débora Domingues.
Enquanto gestora, seu trabalho tem se destacado nos últimos anos pelas visíveis mudanças em todas as áreas. “Iniciamos uma gestão inovadora, técnica e totalmente voltada para a coletividade, aplicando os recursos com zelo e eficiência. Sobretudo, procuramos ser a voz da minoria, especialmente das mulheres, para que as pessoas possam reconhecer que elas têm sua singularidade no sentido de serem firmes e ao mesmo tempo sensíveis a algumas políticas públicas voltadas não só para o público feminino, como também para crianças, jovens, idosos e portadores de necessidades especiais”, salienta.
Com 92% de aprovação, a prefeita é uma inspiração para outras mulheres que também sonham em ocupar espaços de poder. “Nossa avaliação tem sido positiva e os bons resultados mostram que a população conseguiu perceber a transformação da nossa cidade durante esses quase oito anos. Queremos cada vez mais inspirar outras mulheres e despertar nelas o desejo de fazer parte da política, porque é a partir dela que a gente consegue alcançar muitas pessoas ao mesmo tempo e impactá-las positivamente”, conclui.
A presidente do MDB no Novo Gama, Joscilene Martins, concorda e diz que é preciso reconhecer e valorizar as contribuições únicas que as mulheres podem trazer para a política. “Isso significa criar um ambiente acolhedor e inclusivo que encoraje as mulheres a se candidatarem, oferecendo apoio emocional e prático ao longo do processo. Também é importante combater estereótipos de gênero e promover modelos positivos de liderança feminina para inspirar outras mulheres a se envolverem na política”, ressalta.
Vencendo desafios
À frente da Secretaria Municipal de Educação de Valparaíso de Goiás desde o ano de 2017, a professora Rudilene Nobre vem desempenhando um excelente trabalho na pasta e pretende concorrer ao cargo de prefeita ou vice-prefeita nas eleições deste ano. Filiada ao partido MDB, ela pode conquistar o apoio do grupo do prefeito Pábio Mossoró. “Queremos dar continuidade ao trabalho do prefeito, além de melhorar e implementar aquilo que não foi feito”, afirma.
Segundo Rudilene, o ambiente político ainda é dominado pela figura masculina. “Nós, mulheres, sofremos muito para permanecer na frente ou ao lado de tantas pessoas que se colocam como mais competentes, mais instruídas politicamente e que sempre querem nos deixar de lado. Mas precisamos mostrar que temos voz e podemos atuar tanto no Executivo quanto no Legislativo”, frisa.
Apesar dos avanços da legislação brasileira, Rudilene enfatiza que são necessárias mais ações efetivas, para que mais mulheres ocupem espaços de poder. “Porém, é preciso vencer os desafios do machismo de forma mais assertiva e resiliente”, expõe a professora.
Elas por Elas
Moradora de Santo Antônio do Descoberto há 32 anos e presidente do Diretório Municipal do Partido dos Trabalhadores (PT), a professora Railda é pré-candidata à prefeitura da cidade. “A população brasileira é composta em sua maioria por mulheres, mas isso não se reflete nos cargos políticos de decisão”, observa. E acrescenta: “Temos apenas dez senadoras, de um total de 81, e somente 91 deputadas federais de um total de 513 parlamentares. Essa discrepância também se repete nos estados e municípios”.
Railda diz que é preciso ir além da reserva de vagas, garantindo que as vozes e as perspectivas das mulheres sejam ouvidas e consideradas nas políticas públicas. “Dentre as dificuldades, estão a falta de incentivo partidário, que é fruto de uma sociedade patriarcal que tem relegado a mulher ao papel de cuidadora do lar e da família. Isto também dificulta o seu engajamento, porque, para fazer política, é preciso ‘ter tempo’ e esse cuidado com a família dificulta seu maior envolvimento”.
Com o objetivo de ampliar o número de pré-candidatas do PT em 2024, o partido lançou recentemente em Goiás o projeto “Elas por Elas”, uma iniciativa que visa incentivar, fortalecer e dar visibilidade às candidaturas femininas. “É importante continuar incentivando e intensificando a participação das mulheres na política e que, a cada nova eleição, elas possam ocupar mais espaços, especialmente nos municípios onde as políticas públicas acontecem”, ressalta Railda.
Fazendo a diferença
Em Formosa, a vereadora Fernanda Martins de Lima – conhecida como Delegada Fernanda (SD) – é pré-candidata à prefeita nas eleições de 2024. Além de ter sido a vereadora mais votada no município em 2020, dois anos depois ela obteve 12.099 votos para deputada estadual, mostrando sua força política. Para ela, é preciso incentivar as mulheres a concorrerem a cargos eletivos e a estarem presentes na tomada de decisões. “A política é o meio de transformação governamental das sociedades. O nosso grupo encoraja fortemente a participação feminina na vida pública, justamente por acreditarmos que, assim como outros atores, elas têm contribuições muito importantes a fazer”, comenta.
No que diz respeito à legislação eleitoral, a parlamentar avalia que as regras são bem delineadas e facilitam a entrada de mulheres no espectro político, mas isto precisa estar alinhado aos movimentos de conscientização, como molas propulsoras de comportamentos. “Ainda em 2023, fizemos um grande e inédito evento falando dos espaços, falas e vivências de mulheres. Dessa forma, entendo que uma maior participação feminina na política acontece na medida em que mostramos que isso é possível, que é algo acessível e que elas podem fazer muita diferença”, complementa a vereadora.
Delegada Fernanda conta que já foi alvo de preconceito por ser mulher, mas que isso não a inibe de querer enfrentar desafios. “Já sofri ataques políticos, mesmo sendo delegada de polícia. Mas eu me dispus a encarar este caminho e abrir portas para uma política feita com honestidade e transparência, então sabia que ia pagar o preço por essa mudança”, analisa.
Sobre seu projeto político, ela diz que pretende resgatar o município, que está, há muitos anos, em sua opinião, sequestrada por um grupo político que afundou o município em corrupção e abandono. “Eu amo essa cidade e a escolhi como lar, para viver e construir minha família. Nosso projeto é de uma cidade cujos serviços funcionem com regularidade e cuja administração tenha como premissas a honestidade e a virtude nos processos administrativos”, declara Fernanda.
Atuação mais rigorosa
A participação significativa das mulheres em funções de liderança nacional, local e comunitária tornou-se um foco importante na política de desenvolvimento global. No Brasil, a Lei das Eleições (Lei nº 9.504/1997) determina que partidos e coligações devem reservar, no mínimo, 30% das candidaturas a cargos legislativos para mulheres. “As mudanças na legislação são fruto de um trabalho parlamentar incansável realizado pelas mulheres, em todas as esferas. Na prática, os desafios para as candidaturas femininas ainda são enormes”, observa o advogado e especialista em direito eleitoral, Hyulley Machado.
Segundo ele, para cumprir a cota, muitos partidos registram candidaturas laranjas. Uma das respostas para o presente problema será uma maior fiscalização das autoridades. “A novidade nesta eleição é que os tribunais eleitorais serão muito mais rígidos quanto à punição de falsas candidaturas, ou seja, a chapa será indeferida e nenhum vereador será eleito. Os partidos devem ser transparentes na utilização desses recursos, que sejam exclusivos de fato para as mulheres, e não utilizados para beneficiar de forma indireta candidaturas de terceiros”, pontua.
Para finalizar, Hyulley alerta que qualquer candidata que se sentir prejudicada de alguma forma no processo eleitoral deverá procurar um advogado eleitoral ou mesmo o Ministério Público, para fazer valer os seus direitos. “Esperamos ter não só mais candidaturas femininas nestas eleições, mas também mais parlamentares, prefeitas e vice-prefeitas eleitas, para uma democracia mais justa e cidades mais humanas”, conclui.