O impacto do escândalo: políticos outrora em ascensão hoje amargam no ostracismo

18 fevereiro 2025 às 13h11

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Casos envolvendo condutas inadequadas ou criminosas podem resultar não apenas em processos judiciais e afastamento do cargo, mas também em um impacto irreversível na opinião pública. Em um cenário em que a transparência e a ética são cada vez mais exigidas, políticos envolvidos em escândalos enfrentam dificuldades para manter apoio eleitoral e recuperar sua imagem, mesmo após eventuais absolvições.
Um exemplo é o do atual deputado estadual Cristóvão Tormin (PRD). Na época em que ainda era prefeito de Luziânia, o Ministério Público de Goiás (MPGO) o denunciou por tentativa de estupro, crime ocorrido em 2012, quando ele ocupava a função de deputado estadual. Tormin também foi denunciado, na mesma peça acusatória, de ter cometido o crime de estupro em 2014, já como chefe do Executivo local. Ambos os casos envolveram uma mesma vítima, uma servidora municipal.
O Juízo da 2ª Vara Criminal da Comarca de Luziânia aceitou a denúncia referente ao crime de 2012, enquanto o caso de 2014 foi encaminhado ao Tribunal de Justiça de Goiás (TJGO). Outras acusações contra ele, à época, seguiram sob investigação.
No mesmo período, o MPGO também propôs uma nova ação de improbidade administrativa contra Tormin por atos contra a dignidade sexual de uma servidora nos últimos seis anos. O órgão pediu seu afastamento do cargo, o bloqueio de bens no valor de R$ 2,6 milhões e a remoção de um vídeo em que ele intimida a vítima. A ação pontuou que a permanência de Cristóvão na função comprometia a moralidade administrativa e reforçava o temor das vítimas.
Quem acompanha as redes sociais do político, hoje percebe um baixo engajamento e uma estratégia comum entre aqueles que tentam alavancar seu apoio nas plataformas digitais: a interação de perfis aparentemente falsos em suas publicações. O ex-prefeito de Luziânia, que já teve forte influência na política local, entrou em ostracismo. Atualmente, passa despercebido e raramente é visto em eventos políticos. Na última eleição municipal, seu apoio ao então candidato Waltinho (PP) não teve qualquer efeito prático.

Segundo o advogado Raynner Tiago Barbosa Matos, escândalos envolvendo agentes públicos podem gerar diversas implicações jurídicas. “Inicialmente, as denúncias e suspeitas levantadas podem desencadear investigações nos âmbitos civil, administrativo e criminal, conduzidas pelo Ministério Público, Polícia Federal e Comissões Parlamentares de Inquérito (CPIs)”, esclarece.
Caso sejam confirmadas as irregularidades, o agente público pode enfrentar processos de cassação de mandato, ações de improbidade administrativa e ações penais. Se houver condenação em segunda instância por determinados crimes, a Lei Complementar nº 135/2010 – conhecida como Lei da Ficha Limpa – prevê a possibilidade de inelegibilidade por um período determinado.

A idoneidade moral é um critério fundamental para a elegibilidade de candidatos a cargos públicos no Brasil. “A Lei da Ficha Limpa estabelece critérios rigorosos para impedir que candidatos com históricos de condenações judiciais assumam funções públicas, especialmente aqueles condenados em segunda instância por crimes como corrupção, lavagem de dinheiro e abuso de poder econômico”, destaca Matos.
O advogado ressalta ainda que a reputação de um agente político é essencial para sua relação com o eleitorado e sua atuação quando eleito. “No entanto, quando há acusações infundadas, a Constituição Federal garante o direito de resposta, permitindo que o acusado apresente sua versão dos fatos”, pondera.
Por fim, Raynner acrescenta que a construção da imagem pública deve ser sempre pautada por uma conduta ética. “O respeito à legislação é um fator essencial para garantir uma trajetória política sólida, evitando não apenas a perda de capital político e impedimentos legais, mas também o afastamento do eleitorado”, conclui.
O caso Silvio Almeida
Um outro assunto de repercussão nacional foi o do então ministro dos Direitos Humanos, Silvio Almeida, durante a atual gestão do presidente Lula (PT). Na época, seis mulheres acusaram Silvio de assédio ou importunação sexual. Entre as denunciantes estavam a ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco, uma advogada e quatro ex-alunas do ex-ministro. As denúncias começaram a vir à tona em setembro de 2024, quando a primeira acusação foi divulgada. Desde então, a Polícia Federal e o Ministério Público do Trabalho abriram inquéritos para investigar o caso.
Anielle relatou ter sido vítima de importunação sexual desde o período de transição do governo, no final de 2022. À época, a ministra relatou que os episódios se intensificaram ao longo do tempo, passando de falas e cantadas inadequadas para situações mais graves, incluindo contato físico indesejado durante uma reunião do governo em maio de 2023. Silvio Almeida foi demitido, muito embora tenha negado todas as acusações.
Mau uso do poder
A cientista política Andreia Maidana explica que escândalos políticos afetam profundamente a credibilidade de um político, pois “automaticamente remetem à população e ao eleitorado a ideia de mau uso ou abuso de poder, instaurando uma desconfiança generalizada sobre sua atuação”. Além disso, ela lembra que tais fatos “afastam o interesse do cidadão pela política, criando um descrédito ao sistema político e às suas instituições”.
Apesar do impacto negativo, Maidana ressalta que a recuperação da confiança do público depende de diversos fatores. “Há exemplos de políticos que, mesmo após grandes escândalos, conseguiram se manter na arena política. O caso mais recente é do presidente dos EUA, Donald Trump, que teve seu nome envolvido em escândalos e, mesmo assim, foi eleito para um segundo mandato”, analisa. Segundo ela, “o tipo e o alcance do caso, assim como a forma como a crise é gerida, fazem toda a diferença”.

Sobre a possibilidade de um político cair no ostracismo definitivo, a cientista política argumenta: “A história deixa claro que é possível reconstruir a carreira. Além da ‘memória curta’ da população, políticos contam com assessorias especializadas para gerir crises, conduzindo estratégias que podem amenizar o impacto dos escândalos e até mesmo fazer com que caiam no esquecimento”.
Por outro lado, Maidana alerta que as polêmicas podem ser amplificadas pela mídia e pelo alcance das plataformas digitais, dificultando a gestão da crise e a recuperação da imagem. “Os efeitos negativos podem perpetuar por anos nas redes sociais”, avalia.
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