O artigo 5º, inciso LXXIV, da Constituição brasileira, prevê que o Estado deve fornecer assistência jurídica integral e gratuita às populações em situação de vulnerabilidade socioeconômica. Quem cumpre essa prerrogativa é a Defensoria Pública, que deve proporcionar a essas pessoas o amplo acesso à Justiça, sendo este um direito fundamental dos cidadãos.

No Entorno, a instituição está presente em Luziânia e Valparaíso, mas já há projetos para expansão a outras cidades da região, como Águas Lindas e Santo Antônio do Descoberto. Somente em Valparaíso, por exemplo, já foram realizados mais de 16.500 atendimentos em cerca de um ano de funcionamento, no bairro Parque Esplanada III.

E é lá que atua o coordenador do Núcleo de Defensorias Públicas Especializadas do município, o defensor público Pedro Mafra Neto. Na entrevista a seguir, concedida ao Jornal Opção Entorno, ele ressalta a importância da instituição e detalha sua atuação na região adjacente ao Distrito Federal.

Hellen Lopes – Quais são os principais desafios da Defensoria Pública?

Pedro Mafra Neto – O principal desafio que a Defensoria Pública encontra atualmente é a necessidade de maior expansão territorial, não apenas no Estado de Goiás, mas em todo o país. Ou seja, para que toda a população vulnerável possa ter um efetivo acesso à Justiça, faz-se necessário que a Defensoria Pública esteja instalada em todas as comarcas do estado. Vale ressaltar, sobre a expansão, que a Emenda Constitucional no 80/2014, também conhecida como “Defensoria para Todos”, determinou que, no prazo de oito anos, a contar daquela data, deveria existir defensores públicos em todas as unidades jurisdicionais do país.

Aqui na região do Entorno do Distrito Federal, temos uma série de outros desafios, o que é comum de se esperar de uma instituição que, em Valparaíso de Goiás, foi instalada há aproximadamente um ano, em 20 de setembro de 2023. Assim, temos o desafio de chegar naqueles que mais precisam e sequer possuem a informação sobre a possibilidade de buscar os nossos serviços. Por isso, é sempre muito importante o bom funcionamento da nossa unidade, as atividades realizadas pelos defensores fora dos gabinetes, bem como os espaços de divulgação dos serviços prestados pela Defensoria Pública.

Hellen Lopes – Qual o papel da Defensoria para os cidadãos?

Pedro Mafra Neto – Enquanto instituição permanente, autônoma e essencial à função jurisdicional, a Defensoria Pública se torna a porta de entrada para a população que deseja garantir direitos, buscar soluções de conflitos e receber orientações jurídicas de forma totalmente gratuita. Vale ressaltar que, nos termos previstos na Constituição Federal, a Defensoria Pública deve atender as pessoas consideradas como necessitadas, o que, do ponto de vista socioeconômico, em regra, significa ter uma renda familiar de até três salários mínimos. Contudo, também há outras vulnerabilidades que são contempladas e que são analisadas caso a caso pelos defensores públicos.

Esse atendimento gratuito poderá ser desde uma orientação jurídica, que de antemão esclareça eventual dúvida jurídica, passando por sessões de mediação e conciliação entre partes, realizada por defensores públicos, e também solucionando o conflito desde já, até mesmo no protocolo e acompanhamento de ações judiciais, em todos as instâncias e graus de jurisdição.

Além disso, a Defensoria Pública atua de forma coletiva em prol dos interesses dos necessitados, ou seja, não apenas atendendo os casos individuais, mas realizando trabalhos de âmbito coletivo, tais como inspeções em unidades prisionais, atendimento de grupos vulneráveis, educações em direito, contato direto e diálogo institucional com as redes municipais e estaduais, poderes públicos e órgãos do sistema de Justiça. Assim, a DPE pode expedir recomendações aos poderes públicos, celebrar termos de ajuste de condutas, propor ações civis públicas e várias outras atuações coletivas.

Defensoria Pública de Valparaíso (Foto: Divulgação)

Hellen Lopes – Qual a maior vitória da Defensoria das cidades do Entorno nos últimos anos?

Pedro Mafra Neto – A Defensoria Pública, localizada em Valparaíso de Goiás, foi a primeira instalada no Entorno do DF, que hoje conta também com a unidade localizada em Luziânia. A presença da instituição nessas localidades tem sido muito valiosa para a população do estado que reside distante da capital goiana. O acesso à Justiça realizado diariamente em nossa unidade, todos os dias, transforma a vida de cidadãos em situação de vulnerabilidade.

Em aproximadamente um ano de instalação, já foram mais de 16.500 senhas de atendimento geradas por pessoas que procuraram a nossa instituição, o que dá a dimensão da quantidade de atendimentos realizados pela Defensoria Pública em tão pouco tempo aqui em Valparaíso de Goiás. São desde crianças que obtiveram, por exemplo, o direito ao tratamento de saúde de home care, passando por demandas de pensão alimentícia e que possibilitam que uma criança seja melhor cuidada pela sua guardiã, ou também demandas de identificação civil ou auxílio às pessoas em situação de rua. Todas essas ações transformam vidas.

Nós identificamos que existem muitas vulnerabilidades na região, não apenas no sentido socioeconômico; há ausência de conhecimento sobre direitos básicos, garantias constitucionais e amparo às vítimas de violência em razão de gênero, intolerância religiosa, racial e discriminação em relação à população LGBTQIAPN+, sendo papel da Defensoria Pública a promoção dos direitos humanos. Diversas pessoas que não possuem condições de custear honorários advocatícios, sentiam-se à mercê da sociedade e desconheciam a possibilidade de judicializar certas ações e receber apoio e suporte também extrajudicial.

Hellen Lopes – Há algum projeto importante desenvolvido pela Defensoria para conhecimento da população do Entorno?

Pedro Mafra Neto – Há diversos projetos e campanhas que acontecem na Defensoria Pública. Destaco quatro deles que são realizados de maneira periódica por nós, como, por exemplo, a “Defensoria na Rua” que, por meio do Núcleo Especializado de Direitos Humanos (NUDH), leva atendimento jurídico, integral e gratuito à população em situação de rua de Valparaíso de Goiás, inclusive com busca ativa por essas pessoas nos locais onde costumam frequentar e se estabelecer; o projeto “Meu Pai Tem Nome”, que tem como objetivo a garantia ao direito fundamental de reconhecimento da paternidade biológica ou socioafetiva e de atuar para a erradicação do sub-registro, realizando exames de DNA e mediações; o “Mutirão de retificação de prenome e gênero” para a comunidade LGBTQIAPN+ que deseja essa retificação, bem como a emissão de segunda via da certidão de nascimento e gratuidade da segunda via do RG, além de orientação jurídica em geral; e finalmente, o projeto “Defensoria Itinerante”, no qual os defensores e servidores realizam atendimento jurídico em localidades ainda sem DPE, a fim de atuar em demandas como divórcios, ação de alimentos, investigação de paternidade, retificação de documentos, gratuidade na emissão de documentos e orientação jurídica nas mais diversas searas.

Leia também:

Defensora Pública auxilia STF na ação contra lei que proíbe pessoas trans de usar banheiros femininos em Novo Gama