Poluição do Rio Melchior pode afetar, no futuro, o fornecimento de água no DF e Entorno
14 maio 2024 às 15h30
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Outrora um local de lazer, o Rio Melchior, localizado entre as Regiões Administrativas de Samambaia e Ceilândia, no Distrito Federal, tornou-se um fator de preocupação ambiental, devido à sua degradação acelerada. Por esta razão, o rio foi o tema central de uma reunião proposta pela deputada distrital Paula Belmonte (Cidadania) na comissão geral da Câmara Legislativa do DF (CLDF). Segundo especialistas que participaram do evento, é possível que, no futuro, se nada for feito, o problema não se limite a um único rio, mas haja prejuízos ao próprio fornecimento de água no DF e no Entorno.
Vale destacar que o Melchior é tributário do Rio Descoberto, o qual, por sua vez, alimenta o reservatório Corumbá IV. No DF, 60% da população é abastecida pelo Descoberto, cujo sistema é operado pela Companhia de Saneamento Ambiental do Distrito Federal (Caesb). O excedente beneficia também a cidade de Águas Lindas de Goiás. Já no caso de Corumbá IV, operado tanto pela Caesb quanto pela Companhia Saneamento de Goiás S/A (Saneago), a água tratada é fornecida ao DF e aos municípios de Luziânia, Valparaíso, Cidade Ocidental e Novo Gama.
Atualmente, não há registros de que a poluição do Melchior esteja afetando ambos os sistemas, mas essa realidade pode mudar nos próximos anos, segundo o professor José Francisco Gonçalves Júnior, do Departamento de Ecologia da Universidade de Brasília (UnB). “Hoje, Corumbá não está poluído, mas e daqui a uma década?”, questionou o docente, durante o evento na CLDF.
Ele enfatizou, ainda, sobre a importância do poder público estar atento ao que diz a Academia, para tomar medidas que previnam tragédias ou catástrofes.
“Licença para poluição”
O grande imbróglio envolvendo o Melchior diz respeito ao fato de que o rio está classificado como “classe 4”, a menos exigente em termos de preservação ambiental. Assim, é permitido lançar efluentes nessas águas, contanto que sejam tratados previamente. Na prática, porém, a realidade é outra: “Classe 4 é licença para poluição”, desabafou Gonçalves Júnior.
A representante da Brasília Ambiental, Simone de Moura, rebateu, dizendo que nenhuma empresa está “liberada para poluir” e, em caso de irregularidade, ela recomenda denunciar os responsáveis.
A própria Caesb descarta resíduos no rio oriundos de suas duas estações de tratamento. “Diariamente são lançados 100 milhões de litros de esgoto tratado. É um volume muito grande e o rio tem pouca vazão”, afirmou a superintendente de Operação e Tratamento de Esgotos, Ana Maria Mota.
O Aterro Sanitário de Brasília, por sua vez, que recebe mais de 2 mil toneladas de lixo diariamente, também despeja efluentes no Melchior. “Claro que esse lixo vai gerar chorume, mas ele passa por tratamento antes de ser lançado no rio”, esclareceu o engenheiro civil Wanderley Albuquerque.
Contaminação do rio
Apesar disso, em 24 de janeiro de 2023, um grupo do Laboratório de Limnologia AquaRiparia, da UnB, chefiado pelo professor Gonçalves Júnior e equipe, realizou inspeção visual e fez coleta da água do Rio Melchior e de um afluente para análise. Na época, foram percebidos materiais flutuantes, espuma, resíduos sólidos, óleo e graxa, além de odor fétido. E no exame laboratorial, constatou-se quantidade excessiva de cobre.
A CLDF também publicou um estudo em 2023, intitulado “Instrumentos para Proteção Ambiental do Rio Melchior”. O documento diz que, mesmo com a necessidade de se despejar o esgoto doméstico, “é inegável que os cursos d’água não podem mais servir como meros depósitos de impurezas, lixo e sujeira”.
E a polêmica ainda vai longe: o assunto pode vir a se tornar, inclusive, objeto de Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI). O requerimento já conta com 11 assinaturas.